30 de jan. de 2010

Benditas bolinhas


Uma amiga falou para que eu procurasse um psiquiatra. Psiquiatra?! Puta que pariu... Estou tão mal assim? Depressão?! Não... não haveria de ser depressão. Por que as pessoas não podem ver ninguém triste, chorando por dias? O ser humano não tem tempo para sofrer. Deve ser esta a explicação. Não se permitem sofrer, pois não há espaço de tempo e ideológico para isto. Temos que ser felizes, maduros e ficar bem logo. Piada, né?! Mas afirmo (e o psiquiatra confirmou): era apenas uma tristeza infinita, um vazio enorme por causa da perda, uma saudade descomunal, um querer voltar no tempo e consertar os erros, evitar meia dúzia de discussões motivadas por inseguranças idiotas. Máquina do tempo não há...

"Só o tempo. O tempo cura tudo." Esta frase é uma verdade, mas eu não queria mais ouvir esta verdade. Não aguentava mais todos ao meu redor repetirem isto pra mim. O tempo simplesmente se arrastava! E eu na mesma sintonia: arrastando-me.

Resolvi reagir. Preenchi meus dias com prazeres. Precisava não ficar um minuto sem fazer alguma coisa: praia, academia, teatro, shows, cinema, escolher repertótio, ensaios da banda ("Mais ensaios, meninos! Por favor!"), pagar contas, ler, fazer florais, comprar umas roupas, bolsas, tirar fotografias. Quando acabava o dia, claro, estava esgotada. Tomava banho e dormia. Mas sonhava...

Viver assim não é viver. É fugir. Eis que resolvi seguir o conselho e ir ao psiquiatra. Precisava ficar bem, achar meu equilíbrio de uma forma imediata para poder reencontrá-lo em minha alma e mente.

Ficar naquela sala de espera por mais de uma hora foi um teste de resistência. Primeiro porque não gosto de esperar. Ainda mais por médicos. Não consigo entender porque os médicos sempre estão atrasados. Por que simplesmente não mudam o início do horário das consultas? Pouparia muitos radicais livres nos pacientes... Porém o maior agravante da espera foi ficar parada. Parada sem fazer nada. Vendo Malhação. Malhação!! Logo eu que estava naquela "terapia" de fazer tudo o tempo inteiro e só parar para dormir. Chorei, é obvio. Aquilo era uma tortura.

Quando finalmente entrei naquela sala fui logo dizendo que não era maluca e não tomaria tarja preta. Que estava triste e imaginava não ser depressão. Mas que eu precisava tomar alguma coisa para ficar feliz; perfeito seria se ele, o médico, receitasse uma pílula do esquecimento. "Existe, doutor?"

Fui à consulta dele porque aquela amiga que me sugeriu disse que o tal médico trabalhava primeiramente com homeopatia. E, de fato, ele a receitou e me deu o prazo de 20 dias para retornar. Se não resolvesse, entraria com um antidepressivo. Rezei pra aquilo dar certo...

No outro dia minhas bolinhas brancas e docinhas estavam prontas. Seis bolinhas de uma a nove vezes ao dia. Ele disse para que eu começasse com seis vezes ao dia. Nada disto! Que seis: vou tomar logo é nove vezes!

Tem gente que não acredita em homeopatia, acha que é placebo. Mas homeopatia é como os florais: química mais branda, com formato alternativo, descolado...

Eu acredito e sou a prova que funciona. Benditas bolinhas brancas e docinhas da felicidade! Sim: existe a pílula para o esquecimento. Ela se chama auto-estima e definição do que se quer: ser feliz ou não. Talvez, antes, você precise de umas doses das doces bolinhas...

Joguei na privada

Num relacionamento a gente aprende a ser melhor. Há uma tendência a querer se moldar para agradar ao outro, tentar viver em harmonia - este papo todo da boa convivência... Tentamos nos desapegar de hábitos que antes nem pensávamos fossem reprováveis - tudo pela paz, amor eterno...

Tem gente que acha o fim não arrumar a cama assim que se levanta (hábito apreendido numa criação rígida ou mesmo naturalmente inerente àquela personalidade neurótica). E lá se foi Maria a esticar o lençol, dobrar o cobertor e forrar a cama antes mesmo de fazer seu xixi matinal... Agrada-se João, resigna-se Maria e são felizes então.

Eu tinha um hábito, fruto de exemplo paterno, que não julgava errado. Uma coisa que fazia sem pensar. Simplesmente fazia. Jogava o papel higiênico na privada ao invés de jogá-lo no lixo. Achava que o lixo deveria ser para objetos mais sólidos, como absorventes, frascos vazios de shampoo, etc. Nunca parei para pensar que nosso sistema de esgoto não fosse capaz de triturar aquele papel superfino, "macio, delicado ao toque". Eis que, numa de nossas discussões, meu namorado falou que eu nem jogava o papel no lixo!

Impressionante como a gente tem a mania de falar de coisas que não têm nada a ver com a temática da discussão. Falamos para aumentar o repertório de defeitos reprováveis do outro que nos chateou por um motivo diverso. Falamos para fazer a pessoa se sentir pior. "Mas como assim?! O que tem de mais jogar o papel no vaso?"...

Acabamos. Não por causa do papel no vaso, claro. Até mesmo porque eu moldei-me àquela verdade dele que passou a ser a minha. Entendi que é mais ecologicamente correto jogar o papel na lixeira. Acabamos porque demos no que tínhamos que dar, amamos o que foi possível amar. Fomos felizes, tivemos momentos inesquecíveis, especiais. Fomos especiais um para o outro - mesmo com o meu "defeito abominável" de jogar o papel no vaso e de só depois de mais de um ano ser informada que aquilo o irritava tanto. Acabamos.

Quando decidi enfim esquecê-lo, fiz um ritual simbólico. Joguei o papel no vaso. Senti-me satisfeita com aquele ato de libertação da obrigação de agradá-lo. Sim. Sei que a verdade dele passou a ser a minha e adotei este hábito da lixeira numa boa. Não fazia simplesmente para deixá-lo feliz, porém fiz questão que ele visse que havia mudado minha atitude. A verdade é que jogar aquele papel foi uma singela transgressão...

A água da descarga levou o papel molhado e a minha vontade em agradá-lo e de querê-lo de novo. Fez-se o fim.